Por outras razões, também não há grande interesse científico em estabelecer comparações relativamente ao Presidente da República do chamado Estado Novo. Como é próprio de um regime autocrático, a Constituição de 1933 é uma Constituição meramente nominal ou semântica, pelo que aquilo que na realidade determina o relacionamento entre os diferentes órgãos de poder e a respectiva margem de actuação não é o texto constitucional, mas antes as relações de força tal como são vividas na realidade de um regime ditatorial.
Assim, no regime de 1933 a debilidade real dos poderes do Presidente da República está em ostensiva dissonância com a importância que a Constituição aparentemente lhes atribui (entre outros, a Constituição dá ao Chefe do Estado directamente eleito por sete anos o poder de dissolver a Assembleia Nacional, nomear e demitir livremente o Presidente do Conselho de Ministros e os Ministros, promulgar as leis, dirigir a política externa do Estado).
As vicissitudes da vida política conduziram, de facto, à concentração dos poderes na pessoa do Presidente do Conselho de Ministros, pelo que a relação entre os órgãos do poder político aparentemente fixada pela Constituição acabou, na prática, por resultar completamente esvaziada ou mesmo invertida: um Presidente da República que, na versão originária da Constituição, era directamente "eleito pela Nação" e podia nomear e demitir livremente o Presidente do Conselho e os Ministros, acabou, na realidade dos factos, a ser livremente nomeado, ele sim, pelo Presidente do Conselho de Ministros que detinha a totalidade dos poderes.
A passagem do método de eleição directa do Presidente da República a eleição por parte de um colégio eleitoral, introduzida pela revisão constitucional de 1959 e por causa do sobressalto provocado no regime pela candidatura presidencial do general Humberto Delgado em 1958, correspondeu, tão somente, a uma adaptação parcelar do texto à realidade constitucional.